19 de janeiro de 2011

Da educação e da tecnologia - uma reflexão sobre a prática e o ensino de História

Especial para oConecteGeo

Ao ver que na Campus Party o espaço para as discussões educacionais aumentam a cada edição, é mais que o momento da educação como um todo admitir que estamos noutro século. De que as teorias e sobretudo os instrumentais para o desenvolvimento pedagógico escolar não podem ser mais os mesmos do de nossa geração. Se a cada 5 ou 10 anos uma geração se diferia de outra, o espaço disso é cada vez menor. Nossos pais estranharam a praticidade do controle remoto na tv a cores. Hoje como avós o estranhamento deles é o de ver seus netos lidando com tv´s onde se quer existem botões. Tomo esse exemplo exagerado como uma simples alegoria do que é você se ADAPTAR a uma tecnologia. De perceber ela entrando e facilitando atividades a muito estabelecidas no seu modus operandi diário. Nossos pais e avós tinham um espaço muito grande de tempo, entre a novidade e a transformação dessa novidade em coisa quotidiana. Já nós (e aqui penso e me incluo nessa faixa dos 30 anos de idade) somos provavelmente a última geração “antiga”, no sentido de que presenciamos á vista dos olhos, a aceleração tecnológica em nossas vidas. Você lembra do relógio de pulso? Depois você se lembra que em dado momento ele deixou de ser de corda e definitivamente virou digital? Ou quando a interface dos computadores deixou de ser uma seqüência de códigos estranhos para o sistema Windows? Nós, como nossos avós e pais tivemos que nos adaptar, incluir as novas tecnologias em nossas vidas.
Já as crianças de hoje, chamadas de geração Z ou “nativos digitais” nasceram no mundo do controle remoto, da telefonia celular e não só do computador doméstico, mas do notebook. Esses meninos e meninas são expostos desde muito cedo aos utilitários domésticos de casa, e as possibilidades tecnológicas quotidianas. Um aperto de botão. Uma seqüência lógica. Uma combinação especial. Uma senha. Hoje os pequenos decodificam e decoram seqüências muito mais complexas do que os loucos comandos, nos games de luta dos anos 90. Tiro por meus pequenos sobrinhos que estão agora no quintal correndo, mas 5 minutos atrás brincavam com um PSP (Playstation portátil). Tudo isso não tem o grau de dificuldade aos pequenos como teve a nós. Vou mais além, a sociedade do mercado tem cada vez mais, focos de tecnologias voltadas aos jovens obviamente. E isso tem seus reflexos. Pense que crianças cada vez menores, ganham de presente um aparelho celular. Não que precisem falar com tantas pessoas, mas por que o aparelho vem cada vez mais recheado de atrativos. Tira foto, toca música, conecta a redes sociais, tem joguinhos imbutidos, telas com cada vez mais qualidade.
Uma vez que essa geração esta “treinada” e absorve com muito mais facilidade as transformações. E me pergunto se a escola, ou melhor os professores estão preparados para lidar com alunos com esse nível de compreensão. Claro que falo de uma juventude urbana, com relativo acesso as tecnologias, incluso aqui o aluno de um colégio de elite quanto aquele que estuda em colégio público e usa a lan-house do bairro. Pegando minha área de formação que é História, tive ótimos professores, preocupados em como fazer uso dos variados meios de forma pedagógica satisfatória. Lembro da graduação como um espaço onde foi sugerido o uso de quadrinhos, o uso de música com análise da letra, o uso da fotografia, de trechos de filme, e de todo “documento histórico” material ou imaterial para que os alunos chegassem ou, pelo menos começassem a desenvolver uma noção das transformações humanas e sociais no tempo. Foi rico. Mas retomo dois parágrafos atrás para lembrar que professores e alunos são de gerações diferentes. E me pergunto se é possível se adaptar. Se é possível associar os elementos contemporâneos da juventude á prática de ensino de história.
A resposta é sim. A questão é, até que ponto estamos olhando nossos alunos á distância? Não adianta o professor pedir um trabalho escrito se ele não foi elencado e problematizado noutras situações. Essa geração vem de uma vivência imediata, volátil, instantânea e fragmentada. Diferente de você e de mim, eles não tiveram e não terão de esperar um filme 36 poses revelar em 4 dias num laboratório fotográfico. Eles tem 1000 fotos em minutos, e isso também não importa, pois podem apagar tudo. A construção do conhecimento deles não se dará na leitura repetitiva de um texto, mas nas múltiplas associações que dialoguem com seus dias. Lembro de um colega de faculdade que reclamou dos alunos baixarem os trabalhos de sites da Internet ou mesmo Wikipedia. Depois me peguei perguntando se o colega não previa que isso acontecesse. Aí que está o ponto. Por quê não pensar nos alunos como pequenos historiadores, que confrontem fontes, que se coloquem em dúvida, que batam textos de lugares diferentes estimulando a construção do conhecimento histórico e olhando a Internet com mais crítica?
Não adianta, não podemos pensar e tratar os alunos com uma mentalidade de 20 anos atrás. A Internet e as variadas tecnologias são realidade. E devem ser absorvidas na práxis dos professores para que se façam compreender pelos alunos. O diálogo que vem cada vez mais se perdendo, precisa ser reconstruído em novas bases. E isso vale ainda mais para professores da rede pública. Existe uma função social fundamental. E não a toa é esse professor quem sofre com baixo salário, com o desestímulo, com a violência intra e extra sala de aula. O momento de crise cultural educacional que vivemos só será suplantado em anos de trabalho. Ou virá o caos. De um país tecnicista, acrítico, de analfabetos funcionais submissos.
E a tecnologia tem papel fundamental nisso tudo. É comprovado que os “games” tem alto potencial em ajudar no aprendizado quando orientados pedagogicamente. Hoje diversas instituições disponibilizam obras virtualmente. Existem acervos gratuitos e de domínio público. Porém a questão não é só ter o “objeto”. É preciso transformá-lo em um objeto de aprendizagem, um objeto que muitas vezes se explique por si, fazendo o professor mais do que nunca um “mediador” do conhecimento. Hoje o aparelho de data show pode ir muito mais longe do que foi um retroprojetor de nosso tempo. Qualquer notebook hoje traz um pacote office com PowerPoint. Vou além, existem programas onde é possível baixar vídeos do youtube e outros gratuitos que permitem edição. As possibilidades vão mais longe quando pensamos em plataformas gratuitas como o Linux. O caminho da educação não é mais da transmissão é o da troca. E por conta disso é preciso que os objetos de aprendizagem sejam customizáveis, adaptáveis, como as capas de celular de nossos alunos. O aluno pode escolher o shape e as cores, mas é o professor que define que shapes e cores ele terá disponível para escolher.Por isso, o diálogo "estrutural" entre educação e tecnologias da informação é cada vez mais urgente do que pertinente.
A estrutura escolar muitas vezes não permite ou não comporta tecnologias? Então que tal usar da tecnologia a mão dos próprios alunos? Por que não tirar fotos como os celulares e emprega-las na sala de aula? Que fazer com que busquem fotos antigas em casa motrando o bairro e confrontá-las com do dias de hoje. Ou gravar depoimentos com aparelhos de mp3 em atividades que requeiram a oralidade? Trabalhar a memória de avós, sua experiência de vida e dialogar com o material didático? A infografia disponível gratuitamente em diversos sites de notícias tem grande potencial. Por sua própria natureza um infográfico é o casamento de uma bela imagem com um conteúdo sintético. A disciplina História já passou pela crítica conteudista e é muito mais interessante quando apresenta transformações e processos do que datas estáticas. Acho que este “casamento” ou “namoro” seja pertinente. Pois tem mais facilidade em trabalhar o potencial abstrativo do aluno em diálogo com sua realidade imediata. A educação como um todo já dá sinais de transformação e de se apropriar de ferramentas de maneira muito melhor do que propus aqui. Mas o foco deve ser também o profissional. Será necessário treinamento? Formação? Essas questões demandariam muito mais que outro texto, mas ficam as perguntas. Quando será possível dialogar sem o “abismo técnico geracional” afastando professor e alunos? Ou teremos de esperar uma geração de professores nativos digitais se formar? Acho que não, até lá seríamos um país definitivamente analfabeto.

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